top of page
Buscar
  • Foto do escritorEduardo Machado Homem

O Brasil e a Cultura do Legalismo na Segurança do Trabalho

Atualizado: 22 de jan.

Braço de um homem de terno e o martelo de um juiz nas mãos.

Este texto não foi escrito para criticar as Normas Regulamentadoras ou a legislação aplicada à área de segurança do trabalho. Muito menos para criticar profissionais que dedicam esforços para regularizar a conformidade legal em suas operações.


Seria de uma irresponsabilidade gigante sugerir que o foco nas legislações do trabalho deve ser deixado de lado ou diminuído, afinal a aderência às regulamentações faz parte da permissão social para operar. Questionar o contexto em torno de tantas legislações sobre segurança do trabalho é saudável e vital, mas esquecer que se vive em um país legalista e escolher criticar pura e simplesmente essa realidade, é infantil.

No Brasil, a cultura do legalismo na segurança do trabalho impede avanços e progressos e eu não estou sugerindo que devemos afrouxar as obrigações, afinal, tantas obrigações não estão evitando tragédias.


A origem deste legalismo está, na minha opinião, na nossa herança burocrática portuguesa e na tradição judiciária. As faculdades mais antigas do Brasil são as de Direito e as profissões de maior prestígio social estão ligadas ao mundo das leis. Aliás, para quase todo assunto existe uma legislação que trata da sua regulação e sempre aparecem sugestões para que essa legislação se torne mais rígida e severa. Invariavelmente, isso acontece, mas não tem sido de grande efetividade para o verdadeiro objetivo relacionado a legislação: que ela seja cumprida e oriente a vida em sociedade.


O argumento óbvio para explicar a ineficácia das leis ou para a impunidade generalizada está fundamentado sobre a ausência ou a irrelevância da fiscalização e aplicação de sanções e multas. Em algumas situações mais críticas, a baixa fiscalização caminha ao lado de uma legislação inadequada. Enfim, todo problema acaba se resumindo ao arcabouço legal e à efetividade da fiscalização.


Isso é o legalismo: leis demais, cumprimento de menos, consequências inexistentes.


Isso é o legalismo que esconde a real ineficácia de parte do gerenciamento organizacional, ou seja, os equívocos de decisões administrativas e de gestão que estão ancoradas em aspectos financeiros e econômicos, exclusivamente. Temas relacionados à satisfação e atendimento aos clientes, tecnologia, segurança, meio ambiente e outros ficam relegados para momentos em que a ação é inevitável e a situação incontornável.


O legalismo aliado à contemporização do contexto produz a recorrência de problemas que poderiam ser evitados com boa gestão e investimento. A contemporização é o famoso “veja bem, não se sabe o que aconteceu” e, geralmente, é composta por fatores como crise econômica, aumento do custo, redução da produtividade, redução de vendas, alta taxa de juros, pessoal inexperiente, informação insuficiente, equipe desmotivada, falta de engajamento, grande distância do fornecedor, péssimas condições das estradas, equipamentos antigos, liderança de pouca idade, formação técnica inadequada, ou seja, problemas previamente conhecidos, sem solução rápida e que são convenientes no momento de dar uma explicação sobre um evento indesejado.


Outro componente da contemporização que, junto com o legalismo potencializa a impunidade e a recorrência de acidentes e tragédias, é a complacência. Com o receio ou medo de perder um benefício qualquer, o próprio emprego, a admiração, a aliança, o apoio ou a atenção de alguém, acaba-se por ser demasiado permissivo com a conduta das pessoas, principalmente daquelas que possuem o poder da gestão ou da decisão nas mãos.


Chegamos ao ponto em que estamos hoje quando vemos a recorrência de acidentes e tragédias. E o que nos trouxe até aqui foi o legalismo e a contemporização impulsionada pela complacência.


Para mudar essa situação, precisamos evoluir culturalmente e tratar a vida humana e o meio ambiente como OS VALORES mais preciosos da nossa sociedade. Não estou falando de escrever uma “carta de princípios e valores” com a vida em primeiro lugar porque, afinal, isso seria apenas aspiracional. Também não estou falando de palestras e treinamentos bacanas e motivacionais em que você se emociona ao ouvir o palestrante falar ou ao ver imagens chocantes ou meigas em uma tela.


Fazer com que a vida humana e o meio ambiente se tornem OS VALORES mais importantes da nossa sociedade tem um custo financeiro alto, dói na alma e exige esforço concentrado. Eu acredito que estamos nesse caminho no momento atual em nosso país e que estamos evoluindo de verdade, mas ainda iremos conviver com situações que nos farão questionar se essa evolução está, de fato, acontecendo.


Decisões baseadas em VALORES como a vida humana e o meio ambiente e amparadas pelo uso da tecnologia levarão a sociedade e as organizações a um novo patamar.


Os primeiros passos para que a vida humana e o meio ambiente se tornem OS VALORES na sua organização são:


  1. Fazer um diagnóstico da situação real atual;

  2. Admitir que o problema existe quando se deparar com o resultado do diagnóstico, ou seja, aceitar que a vida humana e o meio ambiente podem não ser VALORES na sua organização;

  3. Desenvolver seus líderes para a gestão sustentável, pois eles são os que possuem a prerrogativa de fomentar a mudança da cultura.

Não há outro caminho e não há caminho fácil.


0 comentário

Posts recentes

Ver tudo
bottom of page